terça-feira, 21 de janeiro de 2014

Ban Ki-Moon agita Genebra-2 sobre a Síria

20/1/2014, [*] MK Bhadrakumar, Indian Punchline 
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu

Ban Ki-Moon (D), Secretário-Geral da ONU convida o MRE do Irã, Mohammad Javad Zarif (E)  para participar da Conferência de Paz na Síria - Genebra-2 
Uma das precondições para ser eleito secretário-geral da ONU é que o candidato tem de ser rotineiramente capaz de chutar “com efeito” e surpreender o goleiro. Mas o atual Secretário-Geral, Ban Ki-Moon, acaba de chutar uma que, em vez de mudar de rumo e “cair para dentro do gol”, mudou de direção para fora do gol, diretamente para o mato. O Secretário-Geral insiste que não sabia que estava chutando com tanto efeito; quase disse que “saiu sem querer”.

Claro, a variação é muito importante na diplomacia, e o convite de último momento que Ban fez ao Irã para que participe da Conferência Genebra-2 sobre a Síria nem foi completamente inesperado. Mas quando apareceu, surpreendeu, sim. Particularmente, Washington. A porta-voz, Jen Psaki, do Departamento de Estado pediu que Ban rescinda o convite, a menos que o Irã endosse “integral e publicamente” o Comunicado de Junho de 2002 [chamado “Genebra-1”]. A Coalizão Nacional Síria [orig. Syrian National Coalition (SNC)] ameaçou não aparecer em Genebra-2, se o Irã lá estiver.

Nota da redecastorphoto: Faltando menos de 24 horas do início de Genebra-2 Ban Ki-Moon desconvidou o Irã. O “chute com efeito” do Secretário-Geral da ONU saiu muito longe do gol!

Ban Ki-Moon, Secretário-Geral da ONU, "desconvida" Hassan Rouhani, Presidente do Irã de Genebra-2
O próprio Ban tem dito e repetido que “falou longamente” com o Ministro de Relações Exteriores do Irã, Javad Sharif, o qual lhe “assegurou” que “compreende” que “a base” de Genebra-2 é o texto aprovado em junho de 2012. Prima facie, parece que é o fim do mundo, menos de 72 horas antes do início de Genebra-2 marcado para amanhã, 4ª-feira (22/1/2014).

Contudo, se se analisa melhor, a arte do chute direto a gol é difícil e exige longo, dedicado treinamento para que dê o resultado que se deseja que dê. Ban, todos sabemos, jamais deu qualquer sinal de algum dia ter praticando chute direto a gol nas horas de folga. A reação de Psaki pode ter sido completa encenação? Talvez o governo Obama já estivesse informado de que Ban andava treinando tiro a gol com muita determinação e dando o melhor de si, nesses últimos dias, enquanto Genebra-2 se aproximava? Talvez... o treinador fosse Tio Sam em pessoa? Talvez tudo isso não passe de estratégia de retirada?

Jen Psaki
Psaki disse com tanto de vagueza quanto de informação que Washington até conseguiria conviver com a participação do Irã, desde que os iranianos explicitamente endossem o Comunicado de junho de 2012, embora tenha usado uma fórmula de dupla negação para dizê-lo:

É algo que o Irã jamais fez publicamente e algo que nós [EUA] dizemos claramente, há muito tempo, que é indispensável. Se o Irã não aceitar publicamente e integralmente o Comunicado de Genebra, o convite deve ser rescindido.

Teerã ainda não respondeu. Apenas registrou o recebimento do convite, registro protocolar. Considerados o engenho e a arte do pensamento dos persas, eles estão certamente formatando uma declaração em que endossem o comunicado de junho de 2012, mas de tal modo e com tais palavras que nada sugira que estejam cedendo à precondição imposta pelos norte-americanos.

Humilhações e embaraços provocados e sofridos são considerações muito importantes naquela parte do mundo. (De fato, guardo nos meus arquivos o fascinante verbete redigido pela CIA, de 1994, sobre “Face” [ing., aproximadamente “autoimagem”, “autoapresentação”], Face” Among the Arabs). Mas, por outro lado, nada disso é, de fato, matéria substancial; é um não assunto, uma não questão, porque o Irã genuinamente nada esconde, que possa de algum modo ameaçar o processo de Genebra-2.

Além disso, Teerã certamente sabe que o governo Obama deseja que o Irã esteja lá, para Genebra-2, na 4ª-feira (22/1/2013); mas teme convidar Teerã publicamente (os sauditas subiriam pelas paredes).

Pela minha avaliação, o verdadeiro problema será o Conselho Nacional Sírio. Na língua malaiala, diz-se que “o coco sempre cai na cabeça de quem mais quer gemer...” O CNS é participante muito relutante de Genebra-2. Agora, se decidir fazê-lo, terá desculpa para pular fora.



[*] MK Bhadrakumar foi diplomata de carreira do Serviço Exterior da Índia. Prestou serviços na União Soviética, Coreia do Sul, Sri Lanka, Alemanha, Afeganistão, Paquistão, Uzbequistão e Turquia. É especialista em questões do Irã, Afeganistão e Paquistão e escreve sobre temas de energia e segurança para várias publicações, dentre as quais The Hindu,Asia Times Online e Indian Punchline. É o filho mais velho de MK Kumaran (1915–1994), famoso escritor, jornalista, tradutor e militante de Kerala.

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